Acupuntura pode tratar a depressão |
Com menos efeitos colaterais causados por tratamentos
farmacológicos, ela ajuda a reduzir as doses dos medicamentos e a
melhorar a resposta aos mesmos |
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No tratamento da depressão, a acupuntura pode atuar como
auxiliar ao tratamento farmacológico do psiquiatra, ajudando a
reduzir as doses dos medicamentos e a melhorar a resposta aos
mesmos |
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acupuntura
sempre foi usada na China e em todo o Oriente para tratar das
mais variadas queixas, agravos à saúde e doenças em geral. No
ocidente, ela ficou mais conhecida pelo seu potencial
anti-inflamatório e analgésico.
No
entanto, ela tem uma gama de ação muito mais ampla do que só
como terapia para dor, podendo ser usada, também, no
transtorno depressivo, seja como tratamento coadjuvante ao
tratamento psiquiátrico farmacológico e às psicoterapias, seja
como tratamento soberano, quando, sozinha, ela consegue
controlar alguns quadros depressivos.
Para falar mais sobre o assunto, o Portal Terceira Idade
entrevistou o Dr. Márcio De Luna, especialista em acupuntura
há 33 anos, fisioterapeuta, presidente da ABA-RJ (Associação
Brasileira de Acupuntura do Rio de Janeiro) e colunista do
Portal. Acompanhe a entrevista, abaixo.
Portal Terceira Idade: Qual a contribuição da
acupuntura na depressão?
Dr. Márcio De Luna: Em geral, quando é um
quadro depressivo leve e recente, a acupuntura sozinha,
frequentemente, consegue normalizar o humor do paciente.
Porém, na maioria das vezes o paciente apresenta um transtorno
depressivo moderado ou grave, que necessita da intervenção do
psiquiatra e uso de medicação antidepressiva.
Nesses casos, a acupuntura atuará como auxiliar ao tratamento
farmacológico do psiquiatra, ajudando a reduzir as doses dos
medicamentos e a melhorar a resposta aos mesmos, o que faz com
que o doente se recupere mais rápido e com menos efeitos
colaterais oriundos do tratamento farmacológico.
Portal: Se a acupuntura é tão boa assim, por que,
então, ela não é indicada pelos psiquiatras como recurso
auxiliar ao tratamento da depressão?
Dr. Luna: Essa é uma pergunta tão boa quanto
difícil de responder. De fato, há vários fatores que concorrem
para a não indicação da acupuntura por parte dos psiquiatras,
psicólogos e profissionais de saúde mental em geral.
O primeiro deles, na minha opinião, é o próprio
desconhecimento acerca das reais indicações e possibilidades
terapêuticas da acupuntura. Não se pode indicar algo que não
se conhece.
Em segundo lugar, o preconceito, pois, muitas vezes, fala mais
alto a “crença” pessoal do psiquiatra ou do profissional da
área psi, ao invés de preponderar uma postura profissional
baseada em evidencias cientificas ou mesmo clínicas.
Em terceiro lugar, há uma falta de confiança e um
desconhecimento, da parte do psiquiatra, em quem indicar para
tratar o seu doente de depressão com acupuntura. Pois, como a
acupuntura não é uma especialidade médica exclusiva – vários
profissionais da área de saúde podem se especializar em
acupuntura –, o psiquiatra teme o que um outro profissional,
que ele não conhece a formação acadêmica e cientifica, possa
vir a fazer com o seu paciente, e acabar atrasando a
recuperação do quadro depressivo, ou mesmo piorar o transtorno
em si.
Com isso, psiquiatras e psicólogos acabam preferindo manter o
que classicamente conhecem e já sabem que funciona no
transtorno depressivo, em detrimento de indicarem algo novo e
desconhecido para eles, como a Acupuntura ou outra prática
integrativa e complementar.
Portal: Na sua opinião, o que pode ser feito para a
acupuntura ser mais indicada pelos profissionais de saúde
mental?
Dr. Luna: A primeira coisa já está sendo
feita aqui pelo Portal da Terceira Idade, que é divulgar o
fato como ele é, e isso vocês sempre procuraram fazer e eu sou
testemunha disso. A segunda coisa, bem mais difícil, é a
criação de uma Faculdade de Acupuntura. Com ela, a população
saberia claramente quem é esse profissional chamado
Acupunturista.
Hoje, o que se tem no Brasil é uma zona cinza que permite a
qualquer um se autointitular de acupunturista, já que não há
ainda uma lei federal, nem uma graduação própria, um
bacharelado. Atualmente, no nosso país, os profissionais de
saúde de nível superior (fisioterapeutas, médicos, dentistas,
enfermeiros, psicólogos etc.) que cursaram longas
especializações em acupuntura, acabam sendo confundidos com
aqueles egressos de cursos livres ou técnicos e, portanto, são
desconsiderados e desvalorizados no exercício da sua prática
clinica, pela população e pelos próprios profissionais de
saúde também.
Portal: Como a acupuntura trata a depressão?
Dr. Luna: Bem, isso não é tão fácil de
explicar em poucas linhas, mas vou tentar... A acupuntura
intervém na saúde do individuo, seja reabilitativa, preventiva
ou curativamente, através da inserção de finíssimas agulhas
metálicas em pontos específicos da superfície cutânea,
predeterminados pelos chineses há milênios atrás.
Esses pontos são chamados de Acupontos, ou Pontos de
Acupuntura, e eles têm uma característica, ou uma propriedade
bioelétrica, que é a de possuírem uma baixa impedância, ou
seja, apresentam uma baixa resistência à passagem da corrente
elétrica.
Isso é importante porque, nos estados patológicos (doenças),
essa impedância encontra-se alterada justamente nos pontos de
acupuntura correspondentes aos órgãos e sistemas orgânicos que
já estão doentes ou que vão ficar doentes a curto prazo, e
cuja essa alteração elétrica já está prenunciando.
Os acupontos, apesar de serem pontos bioelétricos, como vimos,
se utilizam do sistema nervoso periférico (nervos) como uma
interface, ou substrato (terreno) material, para que essa rede
elétrica composta pelos pontos de acupuntura e os caminhos
invisíveis que eles formam (sistema de canais chineses de
energia), semelhantes a fios elétricos, possa levar os
estímulos (inputs=sinais de entrada) feitos nesses mesmos
acupontos, para serem traduzidos pelo sistema nervoso central
(cérebro).
Na acupuntura, esses estímulos podem ser as picadas (agulhas),
gelo ou calor (charuto de artemisia que aquece os acupontos),
pressão local com os dedos (Shiatsu ou Do-In), luz (laser, LED
etc.), som (fonoforese, ultrassom etc.), substâncias
medicinais (pomadas, florais, óleos essenciais, etc.),
eletricidade (TENS, eletroterapia etc.), magnetismo (imãs) e
injeção de substancias medicinais alopáticas, homeopáticas,
plasma rico em plaquetas do próprio paciente, soluções
hidrossalinas, vitaminas e etc. Embora os acupontos não sejam
adequados para a injeção de substancias, esse recurso poderá
ser tentado com resultados variados.
Uma vez o cérebro recebendo tais estímulos (inputs), ele os
traduz (transdução dos sinais recebidos) e reage com uma
reposta elétrica (output=sinais de saída) organizadora e
curativa dirigida ao órgão e/ou sistema relacionados com
aquele ponto de acupuntura que foi estimulado anteriormente e
cujo cérebro identificou a alteração elétrica característica
de um órgão ou sistema doentes ou prestes a adoecer.
Portanto, os estímulos da acupuntura (e eu chamo a atenção
aqui para o fato de que os chineses não inventaram nada até o
presente momento que supere os estímulos das agulhas nos
acupontos), são altamente promotores do equilíbrio físico e
mental.
E se o desequilibrio é no próprio cérebro, como no caso da
depressão, as picadas em pontos apropriados irão auxiliar a
recuperação e a retomada do funcionamento normal do cérebro
doente. Se em até 15 sessões de acupuntura o paciente portador
do transtorno depressivo não melhorar, é porque há necessidade
insubstituível de medicação psiquiátrica.
Portal: E como a medicina chinesa e a acupuntura
interpretam a depressão?
Dr. Luna: Para a medicina chinesa, toda e
qualquer doença é uma alteração da energia do organismo, da
nossa bioeletricidade, em ultima analise. Seja essa alteração
na quantidade da energia: deficitária ou excessiva; seja na
qualidade dessa energia: boa ou ruim; ou seja quanto a
circulação dessa mesma energia.
Às vezes, você tem uma quantidade e uma qualidade boas da
energia do organismo, mas ela não está circulando
adequadamente, e aí acaba deixando órgãos/sistemas e
segmentos/regiões mal nutridos, levando também, com isso, a
doenças. E o transtorno depressivo, não é diferente desse
raciocínio, para a medicina chinesa.
Acrescentando a isso que, para os chineses, as doenças mentais
são reflexos do mau funcionamento dos órgãos, que acabam
repercutindo no cérebro, dado as relações fisiológicas
internas que a medicina chinesa descobriu e que a medicina
ocidental sequer considera existir.
Por exemplo: na medicina chinesa, o mau funcionamento do
fígado e do intestino grosso provoca mal humor, que é um
estado mental alterado. Hoje, a relação entre cérebro e
intestino grosso já é reconhecida e bem estudada pela medicina
ocidental.
Em termos de melancolia, tristeza e depressão, para os
chineses, o mau funcionamento tem origem no eixo pulmões e
coração. E essa relação fisiopatológica ainda não é
reconhecida pela medicina ocidental.
Não é que a pessoa seja cardiopata ou um pneumopata, como no
ocidente entendemos. Os chineses sabem que há alterações na
química cerebral na depressão, porém, eles vão mais além, pois
consideram que tudo dentro do organismo está ligado de uma
forma ou de outra. E, para eles, a causa real se encontra no
mau funcionamento do eixo coração-pulmão, mesmo que seja
eletricamente falando, ou, talvez, em relação a alguma
substância produzida por esses órgãos, ainda não descoberta
pela ciência ocidental, que interfere na química cerebral
levando à depressão ou a estados depressivos.
O fato é que eles tratam a depressão usando vários acupontos
relacionados com o funcionamento do eixo coração-pulmão e
obtém resultados.
Isso me faz lembrar que até pouco tempo (aproximadamente 30
anos atrás) o coração era somente considerado um órgão do tipo
bomba mecânica de propulsão do sangue. Até que se descobriu o
peptídeo natriurético atrial (ANP), o primeiro de mais três
que se conhece no total até agora, produzidos pelo coração. E
hoje já se sabe que esses peptídeos cardíacos, além de
manterem o equilíbrio do próprio coração (homeostasia), têm
ação anti-câncer poderosa também.
Isso mostra que a conversa cruzada (crosstalk) entre os órgãos
e sistemas do nosso corpo é muito mais complexa do que podemos
imaginar e ainda há muito para se descobrir na ciência da
saúde, que provavelmente irá comprovar muitas das teorias e
relações fisiológicas e fisiopatológicas que os chineses já
descobriram há muito antes de nós.
Daí podemos concluir que ainda é muito grande o abismo entre
as duas medicinas e as formas de se tratar o ser humano.
Portal: Quais as suas considerações finais?
Dr. Luna: Eu espero, sinceramente, que as
pessoas que nos leem, se já tiveram experiências ruins com a
acupuntura, considerem dar mais uma chance a ela, procurando,
dessa vez, conhecer a formação acadêmica e a faculdade que o
especialista em acupuntura escolhido cursou. Pois, na maioria
das vezes que a acupuntura não logra o efeito que o paciente
espera, a responsabilidade não é da acupuntura como método,
mas, sim, de quem a aplica, como aplica, com que frequência a
aplica e se ela estava bem indicada ou não.
Fotos/ilustrações: divulgação |
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